Salmo 139:23-24
Na vida cristã contemporânea, marcada
pelo ativismo e pela busca de relevância externa, uma das disciplinas
espirituais mais vitais foi perigosamente relegada ao esquecimento: a prática
da introspecção. Este exercício, longe de ser uma imersão mórbida em si mesmo,
é a arte bíblica de se investigar acuradamente à luz da Palavra de Deus. Como
afirmou João Calvino, o verdadeiro conhecimento de nós mesmos só é alcançado
após contemplarmos a face de Deus. Redescobrir o autoexame é um chamado urgente
para trocar a superficialidade pela profundidade e o autoengano pela santidade
genuína.
A introspecção não é uma invenção humana
ou uma sugestão pastoral; é uma ordenança divina. Desde as primeiras páginas da
Escritura, vemos Deus iniciando este processo. Sua pergunta a Adão: "Onde
estás?" (Gênesis 3:9), não buscava informação, mas provocava a
autorreflexão e a confissão. A obrigação de nos examinarmos é reiterada por
todo o Novo Testamento: "Examine-se, pois, o homem a si mesmo" (1
Coríntios 11:28), "Examinai-vos a vós mesmos se permaneceis na fé;
provai-vos a vós mesmos" (2 Coríntios 13:5).
O fundamento desta prática repousa em
duas realidades teológicas inegociáveis: a onisciência de Deus e a
pecaminosidade humana. O salmista ora: "Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu
coração; prova-me e conhece os meus pensamentos. E vê se há em mim algum
caminho mau e guia-me pelo caminho eterno" (Salmo 139:23-24). Este é um
convite para que a luz de Deus ilumine o que já Lhe é perfeitamente conhecido,
mas que frequentemente se esconde de nós mesmos. A necessidade se torna
premente quando confrontamos a advertência de Jeremias de que nosso coração é
"enganoso... e desesperadamente corrupto" (Jeremias 17:9). Sem um
diagnóstico regular, a doença do pecado se agrava em silêncio, sufocando nossa
comunhão com Deus e tornando nosso testemunho ineficaz.
A prática do autoexame envolve verbos de
ação profunda: examinar (investigar atentamente), esquadrinhar (analisar
miudamente, pedaço por pedaço), sondar (examinar o interior intensamente) e
provar (submeter a um teste para ver como pensamos, sentimos e reagimos). Para
realizar essa tarefa, Deus nos concedeu meios práticos:
Oração Humilde: A introspecção sempre
começa de joelhos, suplicando ao Espírito Santo que nos ilumine, quebre nossa
resistência e nos revele o que não conseguimos ou não queremos ver (Salmo
26:2).
A Palavra como Espelho: as Escrituras
são o padrão infalível e o espelho que reflete nossa verdadeira condição (Tiago
1:23-25). A Lei expõe nosso pecado e o Evangelho revela o remédio gracioso em
Cristo.
Questionamento Intencional: Devemos nos
tornar investigadores de nossa própria alma. Perguntas como "Qual foi
minha real motivação?", "Busquei a glória de Deus ou a minha própria
aprovação?", "Houve amargura ou incredulidade nutrida em meu
coração?" são cruciais.
Olhar para Cristo: A introspecção
bíblica não é um mergulho no abismo do nosso pecado, mas uma análise à luz da
perfeição de Cristo. Como aconselhava Robert Murray M'Cheyne, "para cada
olhar para si mesmo, dê dez olhares para Cristo".
Comunhão e Responsabilidade: as
repreensões e observações de irmãos maduros na fé são instrumentos que Deus usa
para nos mostrar pontos cegos. Manter um diário espiritual para registrar
reflexões, pecados e ações de graças também é uma ferramenta valiosa.
O objetivo do autoexame nunca é a
autoflagelação ou a paralisia pela culpa. Seu propósito é profundamente
terapêutico e redentor. Nós examinamos o coração (Provérbios 4:23), a
consciência, a fé e nosso comportamento para:
Visualizar o pecado para mortificá-lo:
sem diagnóstico, não há tratamento. Precisamos nomear o pecado para poder
matá-lo pela força do Espírito.
Identificar carências para serem
supridas por Cristo: A descoberta de nossa fraqueza e vazio nos impulsiona para
a suficiência de nosso Salvador.
Chorar pelos pecados para sermos
consolados: O luto piedoso pelo pecado é o solo fértil onde a graça do consolo
de Cristo floresce (Mateus 5:4).
Buscar a Cristo mais ardentemente: Em
última análise, ver a profundidade de nossa doença nos faz amar mais o Grande
Médico que nos curou a um custo infinito.
A introspecção é, portanto, uma
disciplina de esperança. É o caminho pelo qual saímos da ilusão para a
realidade, da presunção para a dependência, e do pecado oculto para a liberdade
gloriosa encontrada somente em Cristo. Em um mundo que nos incentiva a olhar
para todos os lugares, exceto para dentro com honestidade bíblica, resgatar
esta prática é o ato mais revolucionário que podemos fazer pela saúde de nossa
alma e pela glória de Deus.
Rev. Liberato Pereira dos Santos
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A liberdade gloriosa é encontrada somente em Cristo, só Ele nos é suficiente, tem misericórdia de nós Senhor, somos pecadores!
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