Mateus 5:38-42
O convite de Jesus à autonegação é um
dos temas mais desafiadores e transformadores do Sermão do Monte. Até que
ponto a proposta de Cristo é inovadora em relação à forma como o indivíduo se
relaciona consigo mesmo? Não se trata apenas de regras de conduta, mas de uma
transformação profunda na natureza e nos desejos do coração humano.
Um ponto que devemos ter em mente é que
podemos nos distrair com as minúcias do texto mencionado, questionando se
devemos literalmente "dar a outra face" ou "entregar também a
túnica", e, assim, esquecendo o princípio essencial que Jesus estava
ensinando. Essa visão rasa faz com que muitos se percam em debates sobre
detalhes, sem perceber a transformação interna que Cristo oferece.
Jesus não estava tanto preocupado com as
obras específicas que deveríamos fazer, mas com a postura essencial do crente:
uma visão adequada de si mesmo. As ilustrações práticas são apenas para
mostrar a expressão externa dessa disposição interna. Como D. M. Lloyd Jones
coloca de maneira muito clara: "a preocupação primária do Senhor Jesus
envolvia aquilo que somos, e não aquilo que fazemos."
Ao contrário da visão comum de que o
Sermão do Monte seria meramente um "manifesto ético" sem conteúdo
doutrinário, essa passagem está repleta de profundas verdades teológicas.
Quando Jesus usou o exemplo de “dar a outra face” (Mateus 5:39), ele tinha a
intenção de ilustrar o importante princípio da autonegação – a necessidade de
romper com o próprio ego, com o desejo de justiça pessoal, de retaliação ou de
defesa constante dos próprios direitos. A proposta de Cristo é que o
comportamento exterior do cristão seja apenas uma consequência natural de uma
mudança interna, de uma nova perspectiva sobre si mesmo. Isso exige que nos
desfaçamos de uma vez por todas da ideia de "direitos pessoais" —
essa constante preocupação em proteger nosso ego, nossa reputação e nossos
interesses. O crente maduro deve se livrar de vez da defesa típica do homem
caído.
A ideia principal que Cristo nos ensina
é que precisamos morrer para nós mesmos. Isso quer dizer remover aquela
hipersensibilidade do ego que nos faz estar sempre em guarda contra possíveis
ofensas ou ataques. O que se observa é que muitos cristãos têm o "eu à
flor da pele", em um equilíbrio tão precário que a menor perturbação os
desestabiliza completamente.
O ideal cristão, na visão do Mestre, é
chegar a um ponto em que não temos como ser atingidos pelas críticas, ofensas e
injustiças. Não é falta de emoção, nem frieza, é uma libertação interna
que nos faz responder às circunstâncias com a sabedoria que Ele nos concede, ao
invés de reagir com os impulsos de um ego ferido.
Podemos observar dois exemplos
impactantes dessa postura. Em primeiro lugar, o apóstolo Paulo afirma em 1
Coríntios 4:3: "Todavia, a mim, mui pouco se me dá de ser julgado por vós
ou por tribunal humano; nem eu tão pouco julgo a mim mesmo." Paulo havia
confiado inteiramente a Deus o que dizia respeito ao seu julgamento e à sua
reputação, e, por isso, desfrutava de uma liberdade interior extraordinária.
Não menos impressionante é o relato de
George Müller, o grande missionário inglês, sobre sua experiência espiritual:
"Houve um dia em que morri, morri totalmente, morri para George Müller e
suas opiniões, preferências, gostos e vontade; morri para o mundo, sua
aprovação e censura; morri para a aprovação ou condenação da parte de meus
próprios irmãos e amigos." Essa posição está em consonância com a
ideia de Paulo expressa em Gálatas 2:20: “Fui crucificado com Cristo.” De modo
que já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A existência que
atualmente experimento neste corpo é sustentada pela fé no Filho de Deus, que
me amou e se entregou por mim.”
Ninguém pode seguir esses ensinamentos
sem antes ter se libertado do apego ao eu. Isso significa renunciar ao direito
de tomar suas próprias decisões sobre sua vida, seus anseios e até mesmo sobre
como se sente em relação aos outros. É uma entrega tão profunda que só pode ser
mantida pelo poder do Espírito Santo.
A essência do que foi dito é que a
liberdade cristã genuína não é a defesa dos nossos direitos, mas a renúncia
deles. Ao deixarmos de lado nosso ego, nos deparamos com uma nova maneira de
viver, na qual nossa única preocupação é "ser aprovado diante de
Deus."
O que torna viável não apenas "dar
a outra face", mas viver com a graça, o amor e a sabedoria que
caracterizaram o próprio Cristo é essa mudança drástica na visão pessoal. É a
distinção entre uma prática religiosa superficial e uma espiritualidade que
realmente transforma.
Rev. Liberato Pereira dos Santos
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Que o Espírito Santo opere em nós! Glória a Deus!
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